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Crônica: A Terra de Azgoria 2/2.

A Terra de Azgoria.


Leia a primeira parte em: https://meus1001hobbies.blogspot.com/2024/06/historia-de-fantasia-as-terras-de.html?m=1

A Espada Justiceira e o Último Guardião - Parte 2/2

    O ar parecia mais pesado quando Pedro foi despertado por um pequeno raio de sol que ousava atravessar os galhos secos, batendo em seus olhos. Ele se levantou calmamente, sentindo o corpo dolorido da batalha da noite anterior. Cassandra já estava de pé, comendo o musgo azul que crescia sobre as rochas frias. O dia amanheceu diferente aos olhos de Pedro, que caminhava devagar em direção a um fino riacho que ouvia ao longe.

Quando se abaixou para lavar o rosto, sentiu um toque suave em seu ombro esquerdo, uma mão pequena e leve.

— Bom dia, viajante! Como passou a noite, dormiu bem? — disse Sara com um sorriso radiante.

— Dormi melhor do que imaginei que conseguiria em um lugar como este.

— Então vamos. Chegaremos à casa de Nedir em alguns dias — disse Sara, enxugando o rosto e se levantando rapidamente.

Pedro olhou seu reflexo nas águas cristalinas do riacho e, no fundo, viu uma pedrinha brilhante. Ele a pegou e pensou: "Hoje deve ser meu dia de sorte!" Colocando a espada nas costas, eles seguiram viagem. Passaram-se alguns dias, e Pedro sentia que não estava saindo do lugar, até que percebeu uma mudança brusca no ambiente. O Vale de Isilrion continuava a sussurrar, mas dessa vez os sussurros pareciam mais intensos, quase como uma advertência. Sara, percebendo o desconforto de Pedro, tentou tranquilizá-lo e, passando a mão em Cassandra, disse:

— Não se preocupe, Pedro. Nedir era uma das bruxas mais sábias de Ságra. Ela me criou depois que minha mãe faleceu, mas logo tive que ir morar em Ságra por causa da minha idade.

Conforme avançavam na estrada coberta por folhas secas e enlameadas, Pedro notou que o vale ficava cada vez mais sombrio. A sensação de que as árvores seguiam seus passos era aterrorizante; elas pareciam observar cada movimento, e a vegetação pulsava com vida própria. Quando finalmente chegaram à casa de Nedir, Pedro ficou surpreso ao ver que era uma cabana pequena e simples, feita de madeira escura, coberta por musgos e flores que brilhavam em tons pasteis, destoando do vale sombrio de Isilrion. A porta pequena abriu-se sozinha com facilidade, sem fazer som algum, e eles ouviram uma voz feminina que exalava confiança.

— Sara, entre e traga o seu amigo com você!

A cabana era pequena, havia vários potes pendurados, ervas secas, janelas grandes e um pequeno tigre verde-escuro que brincava com a barra da saia marrom de Nedir. Nedir então disse:

— Sente-se aqui, viajante. A terra me avisou da sua chegada. Sara, sirva o chá que está no pote grande na prateleira, sem demora.

Pedro observava Nedir com desconfiança. Era uma mulher misteriosa, e ele não conseguia adivinhar sua idade. A pele era sem rugas, mas o cabelo e os olhos eram brancos como a neve. Sara ofereceu o chá a Pedro.

— Beba, você vai precisar! — disse Sara, entregando um pequeno copo feito de barro.

Ao beber, Pedro sentiu uma sensação estranha, como se sua mente estivesse sendo invadida por memórias que não eram suas. Imagens de um grande exército, liderado por uma bruxa poderosa e um homem forte de cabelos grisalhos, cruzaram sua mente, seguidas por visões de destruição e caos.

— O que... o que é isso? — Pedro perguntou, confuso, levantando-se rapidamente e derrubando os frascos da prateleira.

Nedir, com um olhar trêmulo, tentou segurar a mão de Pedro, mas não conseguiu e, levantando-se, disse:

— Você viu, não é? O passado. A grande guerra está por vir. E essa é a razão pela qual você foi trazido aqui, Pedro. Você não é apenas um viajante qualquer; você é o último descendente dos guardiões de Azgoria, a única esperança contra as forças que estão prestes a despertar. A profecia! A profecia vai se realizar!

— Último guardião? Profecia? — Pedro estava com a vista embaçada, suando frio e com medo.

— Sim, você é filho de Gabriel, e a sucessão parou em você. Nesta nova era, você enfrentará um inimigo poderoso!

Nedir bateu o cajado no chão três vezes, e Pedro desmaiou. Quando acordou, Sara estava sentada ao lado da cama, segurando um diário antigo, com um ar de preocupação.

— Eu ouvia histórias sobre você quando era criança — Sara começou.

— Não era eu! Eu não era nascido — Pedro interrompeu.

— Minha mãe sempre dizia que era meu destino te levar até Hiro para libertar o Vale de Isilrion e proteger o Reino de Ságra.

Quando Sara disse essas palavras, Pedro teve um flash de memória, ele viu seu avô, Zacarias, caído no campo de batalha, com seu pai, Gabriel, ao lado:

— Hiro está dentro de mim agora, e passará para as próximas gerações. Ouço o sussurro dele em minha mente. — Zacarias e Gabriel eram os guardiões de suas épocas. Na última batalha contra Hiro, Zacarias, vendo que seria impossível derrotar Hiro com suas próprias mãos, aprisionou-o em seu próprio corpo com a magia proibida, que a Grande Rainha das Bruxas ensinou para casos extremos. Gabriel, ao ouvir isso da boca de seu pai, lembrou-se do bebê recém-nascido que deixou em casa com a esposa antes de partir para a guerra.

— Preciso de ar! — disse Pedro, saindo pela janela do quarto.

Ao sair, cambaleando pelo jardim florido, Pedro avista um enorme dragão nas copas das árvores secas.

— O seu chamado me acordou, Hiro! Depois de anos adormecida, finalmente estamos juntos novamente — disse Dracari, um dragão negro fosco. Suas garras eram vermelhas, e fumaça saía de suas narinas; seus olhos ardiam como fogo.

Ao ver o dragão, Pedro sentiu o corpo esquentar; seus olhos azuis ficaram amarelos, e seu cabelo ficou vermelho como sangue, esvoaçando bravamente com o forte vento que soprava no vale.

— Querida, senti saudades! — disse Hiro, que já possuía o corpo de Pedro.

Hiro subiu em seu dragão, que voou até o alto de uma colina próxima, onde podia ver o Vale de Isilrion e o Reino de Ságra ao longe.

— Patético, após anos preso no corpo desses humanos imundos, minhas maldições não fizeram tanto estrago assim. Estou cansado... — Hiro deu o comando, esticando a mão em direção a Ságra, e Dracari imediatamente sobrevoou o reino, cuspindo fogo e incendiando as pequenas casas em direção ao castelo. Havia uma parede de proteção que impedia os ataques de Dracari ao castelo por ora. Os olhos de Hiro brilhavam ao ver o caos que seu dragão causava.

— Pedro! — gritou Sara, correndo com toda a velocidade sobre Cassandra. — Pedro, você precisa me ouvir! Esta guerra precisa terminar! Hiro lançou maldições que destruíram os reinos da Terra de Azgoria. Não deixe que ele te consuma, você é a última esperança, o elo forte da sua linhagem!

Hiro, sem dizer uma única palavra, avançou lentamente até Sara. Ela permaneceu paralisada de medo ao ver a fúria que consumia Pedro. Com um movimento rápido e preciso, Hiro sacou a espada flamejante de suas costas e atravessou o coração de Sara. Seus olhos cor de mel, que sempre foram cheios de vida, se apagaram lentamente, fixando-se no rosto de Pedro, que deixou cair uma única lágrima.

Ao ver Sara caída, Pedro, ainda prisioneiro de Hiro, teve uma lembrança dolorosa de Lucy, que também morrera em seus braços. A consciência do que havia feito o atingiu como um golpe, e Pedro começou a lutar desesperadamente contra Hiro, buscando retomar o controle de seu próprio corpo.

— Não seja tolo, você pode ter mais do que já imaginou na vida, ou prefere ser um viajante sem destino, solitário, e acabar como o seu pai? O seu pai, Gabriel, não é? Sabia que fui eu quem o matou? Você devia ser só um bebezinho, e eu sabia que você seria o elo fraco desta linhagem de fracassados. Maldição, você é o último da sua linhagem, não é mesmo! E ainda por cima, veio faltando um braço, que porcaria! Mas não se preocupe, em breve estarei forte o suficiente para tornar este corpo mortal... meu templo imortal.

Pedro ainda sentia que podia ter o controle de volta do seu corpo, pois o sangue e a força de seus ancestrais estavam com ele. As palavras de Hiro ecoavam em sua mente, que já se tornara uma só. Neste momento, Pedro teve a mesma visão de seu ancestral, na última batalha contra Hiro, aprisionando-o em seu próprio corpo. Sabendo que Hiro tornava-se mais forte a cada instante, Pedro sabia o que precisava fazer. Aproveitando uma pequena brecha da fraqueza de Hiro, deu um forte grito:

— A profecia! O último guardião libertará a Terra de Azgoria. Eu, Pedro, filho do guardião Gabriel, despejo meu sangue sobre estas terras e restauro a paz que foi roubada de nós, em nome de Élion!

Em seguida, cravou a espada em seu próprio peito, perfurando o coração. No mesmo instante, Dracari virou cinzas, e as criaturas perversas que habitavam a Terra de Azgoria desapareceram. A espada se quebrou em pedaços, e uma forte luz surgiu na colina. Sentindo o brilho intenso, Nedir caiu de joelhos e murmurou:

— O último guardião... Você conseguiu evitar uma guerra inteira!

A noite já estava se aproximando quando Pedro ouviu a voz de Hiro sumir, enquanto os pássaros cantavam ao longe. O céu, antes vermelho, gradualmente se transformou em um lilás suave, com nuvens cor-de-rosa, como ele nunca tinha visto antes. A brisa do fim da tarde acariciava seu rosto pálido e sofrido. Então, Pedro contemplou o céu claro e estrelado pela primeira e última vez.

Autor: Larissa Pinheiro da Silva.

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