A Terra de Azgoria.
O Vale de Isilrion, a Bruxa e o Viajante - Parte 1/2
Nas terras distantes ao sul de Azgoria, o céu rosa e as nuvens escuras avermelhadas, como se anunciando perigos ocultos. As árvores do Vale de Isilrion eram retorcidas e assustadoras, sussurrando segredos antigos vividos pelos deuses. O vento frio das montanhas batia no rosto triste de Pedro enquanto cobria-se com um pano azul escuro. Ele era um viajante solitário, marcado pela história de guerra e ferido pelas perdas do passado. Sua única companhia era Cassandra, sua égua. Cassandra fora resgatada ainda filhote por Pedro, de mercadores piratas escravizadores de cavalos mágicos. Ela tinha uma pelagem vermelha como fogo, olhos negros como a noite e era três vezes maior que um cavalo comum. Sua força e rapidez a tornava única.
O Vale de Isilrion era famoso por suas maldições, criaturas mágicas, ladrões de sapatos e praticantes de magia escura. Pedro não queria problemas, mas não sabia o que o destino lhe aguardava. Enquanto caminhava por terras onde até o sol se recusava a tocar, as árvores sussurravam: "Viajante, estas terras não foram feitas por Élion para os pés de um humano fraco!" Pedro ignorava os susurros que o perseguia há dois dias quando ouviu gritos horripilantes de uma mulher. Rapidamente, Cassandra começou a caminhar. Ela seguiu a direção dos gritos até encontrar uma cena perturbadora: uma jovem bruxa de cabelos negros e pele morena, radiante apesar da situação desesperadora, cercada por ogros de barro, criaturas grotescas que podiam transformar-se em grandes monstros.
— Bruxa miserável, onde conseguiu estes sapatos dourados? — um dos ogros bradou, zombando de sua fraqueza. Pedro observou enquanto os ogros roubavam os sapatos dourados da jovem bruxa. Sem sua varinha, estava indefesa, pois era jovem e inexperiente. Pedro, desesperançoso e marcado pela perda de sua amada Lucy, olhou para seu braço amputado e acariciou Cassandra, refletindo sobre a situação.
— Ela não vale os sapatos que usa, o chão que pisa ou que meu sangue seja derramado — pensou Pedro, decidido a continuar sua jornada sem interferir.
Mas quando ele se preparava para seguir em frente, ouvi o grito forte e cheio de desespero:
— Sobre essas terras abençoadas por Élion, que a justiça sempre prevaleça!
—Abençoada?— Os ogros gargalhavam e zombavam — Bruxa tola, está no Vale de Isilrion!
Nesse momento, veio uma lembrança em Pedro de sua amada Lucy, que sempre dizia estas palavras, Lucy era uma mulher doce e bondosa, era como um raio de sol batendo no jardim encantado. Foram também as últimas palavras de Lucy, que fora vítima de saqueadores. Eles a deixaram à beira da morte em sua casa quando Pedro a encontrou. Os saqueadores estavam ainda por perto e atacaram Pedro desprevenido, cortando-lhe o braço e dizendo:
— Diga a todos que os Draugonios voltaram das terras do leste, camponês.
Os Draugonios eram perversos, queimavam as casas, escravizavam as mulheres, vendiam as crianças e matavam os homens que cruzavam seu caminho. Eram pura destruição e suas almas eram vazias de tudo o que há de bom. No momento, Pedro não pensou duas vezes. Deu o comando a Cassandra, determinado.
— Ela precisa de minha ajuda — disse. Avançou em direção ao grupo de ogros.
— Ei, vocês! Deixem a bruxa em paz — ordenou Pedro, sua voz ressoando com autoridade.
Os ogros se viraram, surpresos.
— Quem é você para nos dizer o que fazer, humano? — Um dos ogros retrucou, com suas mãos se transformando em patas de búfalo.
Pedro não hesitou.
— Sou apenas um homem em busca de paz, mas não permitirei injustiças diante dos meus olhos.
Pedro era portador de um artefato mágico que herdara de sua família, uma espada de fogo azul, banhada com sangue das criaturas das trevas, capaz de cortar e matar qualquer ser mágico. Com Cassandra correndo entre os ogros, Pedro desferiu golpes certeiros, decepando as cabeças dos ogros. Ao caírem no chão, as cabeças se transformaram em tortas de nifirlo, uma fruta de sua terra natal. Pedro nunca testemunhara algo parecido. Rapidamente olhou para a bruxa, com os olhos azuis tremendo de medo e a boca ensanguentada pelo uso da espada que causava ferimentos internos toda vez que a usava, era sua maldição, e disse:
— Bruxa! Que crimes tu comete e em nome de quem?
Pedro apontou sua espada flamejante para ela assustado com o que acabara de presenciar, sua voz carregada de desconfiança e cansaço. A bruxa abaixou-se calmamente, pegou uma das tortas e respondeu com voz suave e aliviada:
— Élion me salvou hoje, minha magia não vem da escuridão. Não reconhece meu brasão, viajante?
Pedro observou atentamente. O brasão que ela mostrava era pequeno e dourado, bordado com cabelos azuis de sereias das águas frias das cavernas de Isilrion. Nele, estava inscrito: "Grande Rainha, Bruxas Guerreiras de Ságra". Era um símbolo estranho para Pedro, que não estava familiarizado com as criaturas deste vale. Continuou, oferecendo a torta a Pedro:
— O chão é mágico aqui, que pertence à Grande Rainha. Só precisei sussurrar algumas palavrinhas, viajante. Não tenha medo, devo minha vida a você. Se não chegasse a tempo, os ogros teriam me devorado. Você não é daqui, não é? Está com fome?
Pedro hesitou por um momento, sentindo o peso da espada e o cansaço da confusão. Ele abaixou a espada, aceitando a torta com gratidão. Apesar de suas desconfianças iniciais, algo no olhar sincero dela o tranquilizou. Era tarde e o sol já se punha. Algo naquela criatura pequena lembrava sua amada Lucy. Pela primeira vez em anos, Pedro sorriu ao lembrar de Lucy com carinho ao invés de culpa.
— Eu sou Pedro — disse Pedro, dando um pedaço de torta a Cassandra.
— Eu já sabia, sua égua me contou — disse a bruxa se sentando em uma pedra coberta de folhas e cogumelos ao redor — Sou Sara, uma das bruxas da floresta, novata do reino de Ságra. Fui enviada em uma missão de iniciação. Apenas as melhores devem permanecer. Sinto que não será fácil. Eu deveria estar morta se não fosse por você!
Pedro olhou nos olhos cor de mel de Sara e sentiu o medo e a angústia da jovem bruxa.
— Eu sou apenas um viajante. Não tenho família ou bens e tudo o que tenho está diante dos teus olhos. Hoje, hoje foi diferente, há meses não me sentia tão vivo! — e pensou, cobrindo o chão com uma manta de lã marrom "Será que estou enfeitiçado por esta bruxa?"
Sara interrompeu com um bocejo e disse:
— Pedro, já que está andando sem rumo, gostaria de me acompanhar até o meu destino?
Cassandra ficou ligeiramente agitada, balançando a crina, sua pelagem ficou escura e Pedro entendeu o que só um amigo poderia entender. Mesmo querendo negar, sua mente pensou em dizer não, mas sua boca disse sim.
— Claro, será um prazer!— disse Pedro.
— Você tem segredos, Pedro. Eu vejo isso em você, minha divida com você é eterna... — Pedro interrompe desacreditado do que acabara de ouvir:
— Eterna? Aposto que vamos morrer ainda hoje! Nunca estive num lugar mais perigoso que este! Faz dois dias que estou perdido neste vale, comendo coelhos, conversando com as árvores e me perguntando por que há tantos ladrões de sapatos aqui!
Sara começa a rir como nunca antes, olhando para Pedro, que se ajeitava próximo a Cassandra para dormir. Ela suspira suavemente e sussurra enquanto se deita sobre uma cama de cogumelos que ordenou que se formasse.
— Não se preocupe viajante, não estamos longe da casa de minha amiga, Nedir.
continua...
Leia a segunda parte em: https://meus1001hobbies.blogspot.com/2024/08/cronica-terra-de-azgoria-22.html?m=1&fbclid=PAZXh0bgNhZW0CMTEAAaZ_DnUxO7Iyarzpsw5_FmwPOoYou75OG13GhWszhKINTumcctJEJYXoSbM_aem_W8GnbH2cqeLRXDmFTILDDg
Autor: Larissa Pinheiro da Silva